terça-feira, 19 de maio de 2009

A escola tem um futuro?

Por *Márcio Cabral

Sabe aqueles chavões “o futuro está na educação”; “pense no futuro, seja amigo da escola”? A todo instante somos bombardeados pela opinião de que a saída para os problemas sociais, sejam eles a miséria, a violência, o desemprego, estariam numa educação de qualidade. Globalizado o mundo, também globalizou-se o censo comum de que as diferenças sociais eram mais evidentes nas sociedades em que a educação não é tratada como prioridade. Para isto, fala-se o tempo todo em novas tecnologias, transformações do mundo do trabalho, da restruturação do sistema de produção, enfim, o diagnóstico sempre aponta para a constatação de que a escola não estaria em sintonia com o advento do novo século.



O que precisamos saber hoje é se esta escola, que historicamente concebemos e reivindicamos, tem futuro num mundo com constantes transformações. Só para rememorar os desavisados, as consignas da escola democrática baseada nos valores da educação pública, gratuita e para todos, nada mais são do que bandeiras levantas pelos jacobinos durante a revolução francesa no século 18 e, portanto, não são nada inovadoras quando apresentadas mais de dois séculos depois do advento do iluminismo. E também não podemos cair no discurso fácil de que tudo pode mudar a partir da educação, até porque diversos autores já provaram que a escola, embora permeada de contradições, serve muito mais para conservar valores de uma determinada cultura, do que para “revolucionar”.



Além de conservar os valores do capitalismo, esta escola não é a mesma para todo mundo. Lógico que enquanto existirem classes sociais, e estas estiverem em confronto entre si, o trabalho será sempre o fator histórico que moldará a educação de toda a humanidade. Por conta disto, existe uma escola que pensa e outra que faz, ou melhor, uma escola para os governantes e uma escola para os governados, uma educação para os filhos da burguesia e outra para os filhos dos trabalhadores – essa é a maior contradição da escola moderna, ela não é única, ela também é dividida por classes sociais, ou seja, na sua essência ela carrega consigo uma dualidade.



Então não nos basta reivindicarmos uma escola pública, gratuita e democrática, pois se lutamos pelo fim da exploração do homem pelo homem, a educação burguesa precisa morrer junto com o sistema que a preserva. Sendo assim, precisamos afirmar que a escola do capitalismo não tem futuro.



A escola do futuro



Não basta somente identificarmos as limitações da nossa educação, mas é preciso reivindicar mudanças que apontem para a educação do novo homem, liberto e dono do seu próprio destino. Para isto, devemos construir a escola do futuro, aquela que substituirá a atual, e que edificará uma nova sociedade.



Essa disputa não deve esperar a tomada do poder, mas precisa se dar no embate interno que travamos contra o capital. Portanto, precisamos partir da denúncia da dualidade da escola. Por que existe uma escola para ricos e outra para os filhos dos trabalhadores? Por que ainda permanece uma visão permissiva da escola, que além de admitir estas diferenças também às legitimam? Precisamos reivindicar a Escola Unitária que se diferencia de várias outras propostas pelo princípio de que seu ponto de partida é a escola que está aí, aquela produto do processo histórico do desenvolvimento da sociedade capitalista, a ser superada dialeticamente na “escola unitária”. Essa forma de conceber a construção de uma nova escola, que não se baseia num “deus ex machina”, proporciona-nos um estímulo “extra” para refletirmos sobre a organização escolar com a qual nos deparamos cotidianamente, desejando transformá-la na escola do futuro. É importante refletirmos sobre isto num momento onde o Estado se amplia e a escola se torna, ao mesmo tempo, o centro difusor do conteúdo ético do “Estado” e o eixo de organização cultural da classe trabalhadora. Mas para isto, é preciso acirrarmos a sua disputa.



O pedagogo italiano Mario Manacorda afirma, em seu livro “Marx e a educação moderna”, que, diferente do que muitos afirmam, tanto Marx quanto Engels desenvolveram muitas ideias que já projetavam a escola do futuro. Segundo Manacorda, em “A crítica do programa de Gotha”, Marx já apresentava a opinião de que além de popular, nos marcos do capitalismo, o ensino deveria ser obrigatório e gratuito, como afirma o programa do partido operário alemão (objeto da crítica de Marx), mas também estas escolas devem ser técnicas (teóricas e práticas). Além disto, ele aponta como reacionária a proibição [geral] do trabalho das crianças, porque “o vínculo precoce entre o trabalho produtivo e o ensino é um dos mais potentes meios de transformação da sociedade atual.”



Portanto chegamos a uma questão crucial para os socialistas - precisamos reivindicar a união de ensino e trabalho produtivo para as crianças, que não deve ser encarado como exploração infantil, bem pelo contrário, mas como humanização precoce e universalização dos saberes (tecnológicos, corporais e intelectuais).



Eis que assim acende a luz das ideias para a escola brasileira. É preciso agora, mais do que nunca, reinventarmos a educação de massa. Se queremos debater o sistema nacional de educação, precisamos enfrentar o debate acerca do papel da escola pública. Se partimos do pressuposto que, guardada as exceções, este modelo fracassou e tornou-se cada vez mais excludente, precisamos propor uma nova organização do ensino brasileiro.



Levando em conta o conceito de Escola Unitária, e além disto, de que este deve associar o ensino teórico, prático e corporal, devemos:



1. Tornar obrigatório o ensino escolar básico dos zero as vinte (0 – 20) anos para todos. Para isto, torna-se dever do Estado garantir a escola pública para toda a população nesta faixa etária.



2. Dividir a educação básica em 4 estágios, ou seja: educação infantil (zero aos cinco anos); educação fundamental 1 (seis aos dez anos); educação fundamental 2 (dos onze aos quinze anos) e educação média (dos dezesseis aos vinte anos);



Para a educação infantil deve-se garantir à criança o direito a alimentação, ao ato de brincar, a criatividade e as habilidades artísticas (musicais, teatrais, etc) e a consciência corporal;



Para o primeiro estágio da educação fundamental deve-se garantir a criança o letramento, a alfabetização, a educação física, matemática e artística, associada a introdução aos estudos técnicos, como as técnicas agrícolas e artesanais;



Já no segundo estágio da educação fundamental, além dos estudos sociais, linguísticos, matemáticos históricos, científicos e corporais, deve-se introduzir no currículo, guardada as características econômicas e sociais ao qual esta escola esteja inserida, a introdução das disciplinas tecnológicas gerais (agrícolas, mecânicas e tecnológica, além de técnicas de administração, econômicas e financeiras);



No ensino médio, é preciso atribuir ao jovem a responsabilidade pela construção do seu futuro no mundo do trabalho. Para isto, além dos currículos obrigatórios comuns a todos os anos do ensino médio, é preciso garantir que um terço (1/3) do currículo seja escolhido pelo próprio estudante. Assim ele poderá direcionar a sua formação seja o nível superior tecnológico ou para a acadêmia das ciências.



Embora este seja apenas um esboço, portanto pode estar permeado de falhas e contradições, é preciso que o leitor pelo menos extraia o fundamental – a escola precisa mudar, e isso só ocorrerá se no predispormos a lutar por isto através de um caminho árduo e tão complexo quanto a superação do homem pelo homem. Até porque, como já nos dizia Marx, “o caminho do inferno está pavimentado de boas intenções”.


*Márcio Cabral é diretor de movimento estudantil universitário da UJS.

Um comentário:

MARA NICOLAU disse...

Olá Márcio,boa noite!

Sou completamente favorável às suas colocações e fico feliz em saber que temos jovens engajados nesta luta pela melhoria e adequação de nossos currículos.
Para enfatizar sua opnião, vale lembrar que nossas cças entram na escola sedentos pelo aprender e com o passar dos anos desistimulam-se e qdo não até desaprendem o que já sabiam! Isto se deve ao fato de dependermos de uma educação formal, desarticulada e desprovida do que chamamos provocação, superação e perspectivas. Fatores preponderantes para se manter o jovem de hj alinhado e envolvido ao processo educacional.

até mais. bom trabalho!!!!